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sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Saúde Quilombola

Coisa que gosto, quando estou no quilombo, é olhar para cima à noite e ver que as estrelas estão todas ali, no mesmo local que Deus colocou desde a fundação do tempo. O tempo que estamos no quilombo, parece-me o século passado, e talvez vá além. As lamparinas acesas o fogão a lenha a nos esquentar, a cozinha é o local onde prefiro pendurar minha rede. Pergunto como eles puderam viver isolados por tanto tempo, longe de todos os benefícios do tempo atual.
Tempos atrás as matas forneciam todos os medicamentos necessários, mas agora, em tempos modernos, e o isolamento nem tão grande assim, já há algumas estradas, trouxeram a dependência do remédio de farmácia, os jovens já não reconhecem na mata a farmacopéia necessária para a cura de diversos males menores. Conversando com as pessoas, muitas conheciam remédios caseiros para a gripe, infecções e dores de barriga. Porém, quando estavam doentes, reclamavam de febre e dores no corpo e não tomavam os seus próprios medicamentos.
Dona Procópia do Riachão explica: “Depois que começaram a ir no doutor [na cidade] ninguém confia mais nos remédios daqui. Ninguém sabe mais como cortar raiz de pau. Antigamente assim, quando menino tava doente eu ia pra roça atrás de planta assim e fazia aquele mexido com planta assim e ficava todo mundo bom. Hoje dá até medo de dar chá pros meninos.”
Esta desvalorização de sua cultura antiga, espelhando-se na cultura das cidades vizinhas e achando que esta é melhor do que a sua própria é um fato real e alarmante em vários pontos. Ao invés de cultivarem certos aspectos benéficos de sua cultura, os kalungas querem viver como as pessoas da cidade, deixando para trás tudo que tenha a ver com o seu passado de repressão e discriminação.
Enquanto isso as condições de higiene ou o conhecimento de higiene permanece nos tempos antigos. O arroz é pilado, a água, sem tratamento é tirada de rios e guardada em baldes ou botijões, poucas vezes filtro e se filtro, sabe-se lá as condições da vela, o gosto do cloro na água não foi assimilado pelas crianças, os poucos pontos de água encanada é a mesma água in natura do rio, a vantagem é não ter que caminhar légua com o botijão na cabeça, trabalho em geral devido às mulheres.
Pensamos, muitas vezes que precisamos ter acesso rápido ao médico, mas, sabemos que a medicina curativa é muito mais cara que a preventiva, sendo assim, nos grandes centros, vamos aprendendo quase que naturalmente a preventiva, sendo que aqui, a preventiva muitas vezes, e na maioria das vezes, parte de pequenas mudanças de hábitos que podem ser encaradas como mudanças culturais e/ou comportamentais, e que por isso são muito difíceis de serem implantadas. Todos sabemos como é bom consumirmos uma água saudável e de boa qualidade, e quanto protegidos de diversas doenças e males por termos este saudável hábito, mas como infundir isso no quilombola, como incutir que a adição de uma pequena dose de cloro a água, fará muito mais do que alterar o sabor da água, matará diversos “inimigos invisíveis” capazes de causar diversas doenças e males.
Ano passado, após a visita presidencial uma força tarefa do exército e diversos órgãos estaduais, federais e Ongs, estiveram em alguns pontos do quilombo fazendo diversos exames médicos, e se foram, eles, os medicamentos que foram dados, e os conhecimentos. Tem sido assim tratada a saúde do quilombola, os órgãos vêem, sejam quais forem, fazem exames, distribuem medicamentos e se vão, a famosa medicina “paliativa”. Ficamos felizes quando eles vêem, mas creio, eu particularmente, que mais poderia ser feito. Principalmente porque, por incrível que pareça, as pessoas voltam a adoecer.
Há uma missão que fez mais, que apesar de ter ido, permanece. E como falam dela com saudade. É a Asas de Socorro, que além de vir, trazer os médicos, fazer os exames, e dar os medicamentos, treinaram diversos quilombolas de Cavalcante, Vão do Moleque, e Monte alegre, Tinguizal, como agentes de saúde, alguns deles aproveitados, os de Cavalcante. Mas o conhecimento que lhes foi dado, não se acabará. Inclusive, conta-me o quilombola Osaldo que já usou seus conhecimentos, infelizmente, por duas vezes para socorrer duas de suas meninas. Digo infelizmente por ter sido obrigado a usá-los, e felizmente por tê-los para usar.
É triste saber que o que na cidade é uma simples gripe, aqui é um atalho da pneumonia. E não é somente a falta de médicos, meio de transporte para se chegar a cidade, falta de medicamentos, alimentação pobre que mata, e sim a falta de informação.
A quantidade de agentes de saúde na região quilombola são ínfimos.
Não basta ter conhecimentos, e sim aplicá-los e transferi-los. Temos esta esperança. Que se pense menos na cara medicina curativa e paliativa e se aplique a medicina preventiva que não pare nos agentes, mas que se transfira à população. Afinal, quem melhor do que você próprio para cuidar da sua saúde. Ou como diria minha avó, quem usa o sapato é quem sabe onde lhe aperta o calo.
Natan Dias.

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